Há três coisas que me deixam feliz:
- Desenhar minhas idéias
- Quando compro um livro
- Quando compro material de desenho
Recebi hoje meus novos pincéis e nanquim pelos correios e fico
louco para usá-los.
Não me lembro se já contei pra vocês, mas quando eu era menino, eu
trabalhava feito louco pra comprar material de desenho. Era a minha maior
alegria. Meus amigos achavam estranho, porque a maioria deles usavam o dinheiro
para comprar brinquedos.
Imagino que se eu não viesse de uma família pobre não poderia ser um bom
chargista.
Com o passar do tempo observei que a base para se criar um bom chargista é a soma de tudo:
humor, leitura, conhecimento, senso critico, maturidade e... pobreza. Sim, isso
mesmo. Sabe o porquê? Porque a verdadeira porrada que vemos numa boa charge
(aquela que dá um “soco no estômago”, como diria o Henfil) é proporcional à
indignação do chargista em relação à vida e ao mundo.
O cara que vem da pobreza vê a fome estampada na cara do outro, sente na
pele – às vezes, em ambos os sentidos - as dores da discriminação e da imensa
diferença social, tão gritante nesse país. Sabe das decepções de se adiar
sonhos, das dificuldades em ajudar a família a criar os mais novos e cuidar dos
doentes sem recurso algum, só na dependência do SUS. Isso e mais um monte de
infortúnios que a vida pode proporcionar aos menos favorecidos. Alguém nascido
em berço de ouro, classe alta, nunca vai saber o que é isso.
Tenho raiva daquelas propagandas do Governo Federal e Estadual na tv
onde aparecem aquele monte de pobres felizes e sorridentes. É tudo mentira.
Pobre feliz, só se ganhar na Mega Sena da virada. Detalhe: sozinho!
Outra observação: Chargista só fica bom mesmo depois dos 33 anos de
idade. Místico? Não. É que aí começa a consciência de maturidade (isso se o
cara não for um Peter Pan da vida e não estiver dando umas voltas pela
síndrome). É por volta dessa idade que o indivíduo começa a ter a consciência
de que o tempo é precioso demais e que não se deve gastá-lo com bobagens e
coisas que não valem a pena.
Bem, voltemos ao material de desenho.
Uma vez, aos 11 ou 12 anos de idade, trabalhei quatro meses para comprar
uma caneta à nanquim desegraph 0.4 - era meu sonho de consumo e, na minha cabecinha
inocente, era “O” material de desenho profissional. Imagine...
Comprei a caneta, levei para a escola e a perdi no mesmo dia na volta
pra casa. Foi a maior tristeza da minha vida. Refiz o caminho de volta para a
escola e não consegui achá-la. Foram mais quatro meses até comprar outra.
Acho que isso me abalou psicologicamente. Hoje, tenho três pranchetas
(“pra quê, meu Deus?” Explico: vai que uma fura o pneu no meio de um trabalho a
200 km/h? Salto de uma pra outra num piscar de olhos!), um monte de pincéis,
tintas, estoque de papel (sabe-se lá? Vai que o mundo arrasa, assim do nada
como no calendário Maia ou pinta uma bomba atômica. Como é que vou desenhar na
sala de espera do purgatório?) e mais um monte de coisas em dobro.
Um conhecido me disse que é por causa do meu signo. Disse ele que o
geminiano tem tudo em dobro. Bobagem. Salário que é bom não entra nessa conta,
né?
Abração procêis.
Rico